domingo, 26 de fevereiro de 2012

Detenta ganha o direito de cursar História na UFC

 
Cynthia Corvello, 40 anos, encontrou nos livros a sua liberdade
NATINHO RODRIGUES
Na decisão judicial que autoriza a presidiária a fazer faculdade,
foram destacados seu mérito e conduta carcerária
 
Embora tenha sido condenada a 25 anos e quatro meses de prisão em
regime fechado, a detenta Cynthia Corvello, 40, que cumpre pena no
Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa há quase três
anos, fez questão de apagar a palavra "condenação" de seu dicionário.
 
Desde que foi presa, encontrou nos livros da biblioteca do presídio a
melhor forma de passar as horas ou, por que não dizer, de ganhar tempo
e sentir-se livre novamente?
 
Neste ano, como noticiou a imprensa cearense, a paulista Cynthia
conseguiu ingressar no curso de História da Universidade Federal do
Ceará (UFC) por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Porém,
como cumpre pena em regime fechado, o impasse surgiu. Ela poderia ou
não frequentar a Universidade?
 
Contribuição social
 
Ontem pela manhã, a resposta veio. A juíza da 2ª Vara de Execuções
Penais do Fórum Clóvis Beviláqua, Luciana Teixeira de Souza, atendeu
ao pedido ajuizado pela Defensoria Pública do Estado do Ceará, por
meio do Núcleo Especializado em Execução Penal (Nudep). Cynthia
poderá, sim, estudar História.
 
Na decisão inédita, pelo menos no Ceará, a magistrada destacou a
exemplar conduta carcerária e o mérito individual da detenta,
ressaltando que a contribuição à sociedade será muito maior se
concedido o direito ao estudo à detenta. No presídio, Cynthia coordena
a biblioteca, faz parte de um projeto de incentivo à leitura e ainda
arranja tempo para reger o coral.
 
Na UFC, as aulas começam nesta segunda e Cynthia precisará de forças
para vencer os preconceitos, que já começaram a aparecer nas redes
sociais.
 
Nos primeiros 30 dias, uma equipe da Secretaria da Justiça e Cidadania
do Estado do Ceará (Sejus) acompanhará as idas e vindas de Cynthia e
observará o seu comportamento. Após este período, ela precisará usar
monitoramento eletrônico. As condições do uso do equipamento serão
especificadas em audiência na 2ª Vara de Execuções Penais.
 
Educação para ressocializar
 
"O sistema prisional tem duas funções. A primeira é de restringir a
liberdade, tirar o direito dos detentos de ir e vir. A segunda é de
contribuir para que essas pessoas voltem ao convívio social", ressalta
a secretária da Justiça e Cidadania, Mariana Lobo.
 
Ela lembra que, no Brasil, 50% dos detentos que cumprem a pena, e não
recebem nenhum trabalho de ressocialização, voltam a delinquir. Por
outro lado, a secretária informa que 80% dos que passam por um
processo de ressocialização não voltam a cometer crimes. "Investir na
educação dos detentos, por exemplo, é fundamental, pois a educação é
uma janela para a recuperação", afirma a secretária.
 
Investimentos
 
Em 2010, apenas um interno do sistema penitenciário cearense obteve
aprovação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). No ano passado,
foram 17 aprovados no Enem e dois no Sisu. Édipo Renan Martins Barros,
20, que cumpre pena em regime semiaberto, ingressou no curso Ciências
Humanas da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia
Afro-Brasileira. E Cynthia Corvello, na UFC.
 
O número, explica Mariana Lobo, representa um grande avanço e está
ligado ao fortalecimento da educação prisional, como a realização, no
ano passado, de concurso público para professores do sistema
penitenciário. Neste ano, informa, haverá educação em tempo integral
nos presídios, começando pelo Instituto Penal Professor Olavo Oliveira
II (IPPOO II), em Itaitinga.
 
RAONE SARAIVA
ESPECIAL PARA CIDADE

Nenhum comentário:

Postar um comentário