domingo, 23 de setembro de 2012

Filosofia propõe educar crianças fora de padrões de gênero‏

ilosofia  propõe educar crianças fora de padrões de gênero
Pais adeptos da “criação de gênero neutro” permitem aos filhos usar
roupas de fada e às garotas experimentar vivências tidas como
masculinas
 
Flávia Pegorin - especial para o iG São Paulo | 15/09/2012 08:00:50
 
Getty Images
Antes mesmo de nascer, muitos bebês já ganham um enxoval todo azul ou todo rosa
 
Antes mesmo de entrar no quarto da maternidade, você já sabe se a nova
mãe teve um menino ou uma menina só pelas cores e pelo tema do enfeite
pendurado à porta. Mas hoje um movimento contrário aos padrões de
gênero ganha espaço: o “gender neutral parenting”. A “criação de
gênero neutro”, em tradução livre, não faz distinção entre meninos e
meninas, enxergando apenas uma criança – ou seja, um ser de gênero
neutro.
 
Na prática, esta filosofia vai desde permitir às crianças vivências
ligadas ao gênero oposto – como meninos dançarem balé e meninas
brincarem de luta – a sequer fazer referências sobre o sexo da criança
mesmo para parentes e amigos próximos, a fim de impedir que ela seja
tratada dentro dos padrões convencionais.
“
 
Permitir experiências de meninas e meninos ‘no campo do outro’ é
saudável, mas forçar 100% uma situação de gênero neutro é irreal”,
acredita o psiquiatra Alexandre Saadeh.
 
Os pais adeptos da criação de gênero neutro garantem que pretendem,
assim, ampliar as experiências de vida dos filhos e permitir que eles
escolham, na hora certa, como querem levar a vida. Para os críticos, a
falta de modelos definidos causa uma confusão enorme na cabeça das
crianças e pode ter efeitos maléficos mais tarde.
 
Um dos casos mais polêmicos foi o de Sasha Laxton. Por cinco anos, os
pais se recusaram a revelar o sexo da criança. No início deste ano, na
iminência do ingresso na escola, o casal finalmente contou que Sasha é
um menino. No cartão de Natal enviado pela família nas últimas festas,
ele aparece vestido de fada.
 
Os pais sempre o incentivaram a brincar com o que quisesse, fossem
bonecas, caminhões ou peças de encaixar. Eles também dizem que nunca
bloquearam ou forçaram qualquer desejo do menino ao escolher roupas,
cortes de cabelo e outros artigos do cotidiano. Garantem, enfim, que
Sasha sabe que é um menino, mas tem toda liberdade para ser como
quiser.
 
No espectro oposto, Shiloh Jolie-Pitt, a filha de 6 anos de Brad Pitt
e Angelina Jolie, só se veste como menino. "Ela quer ser um garoto,
então tivemos que cortar o cabelo dela", declarou Jolie à revista
Vanity Fair em 2010. Mas a atriz não está preocupada. "Eu era como ela
quando pequena", completou.
Brainpix
Shiloh: a filha de Angelina Jolie e Brad Pitt prefere roupas de menino
 
Para o psiquiatra Alexandre Saadeh, coordenador do Ambulatório de
Transtorno de Identidade, de Gênero e Orientação Sexual do Hospital
das Clínicas, em São Paulo, proporcionar opções à criança é válido,
mas o exagero não é saudável. “Permitir experiências de meninas e
meninos ‘no campo do outro’ é saudável, mas forçar 100% uma situação
de gênero neutro é irreal. Isso pode causar o efeito completamente
contrário e gerar um adolescente e um adulto muito confuso, que culpa
os pais por isso”, explica ele.
 
“Muitas pessoas ainda acham que a questão do gênero é cultural, mas
hoje sabemos que, a rigor, a identidade é algo fisiológico também”,
completa.
 
A psicopedagoga Irene Maluf concorda. “Nossos hormônios também são
responsáveis por nos fazer procurar nossos desejos e nossos iguais”,
diz. “Crianças na faixa dos 2 ou 3 anos já começam a se separar em
grupos de meninos e meninas por muitos motivos, desde o comportamento
até a impostação de voz”.
 
Irene explica que, mesmo sem saber, as crianças tendem a formular suas
distinções de gênero observando o pai e a mãe. “É quase impossível,
portanto, que uma criança seja criada completamente assexuada. E isso
é bom, pois diferenciar gêneros é uma das bases do desenvolvimento”,
completa.
 
A filosofia da criação de gênero neutro pode ser aplicada com mais
naturalidade. É o caso da designer Denize Barros, que sempre permitiu
que o filho Teodoro se expressasse sobre seus gostos. Ele entrou em
aulas de balé e já usou maquiagem para brincar. “Teo sempre achou
injusto que as meninas pudessem fazer judô sem sofrer pressões, mas o
achavam estranho por ir ao balé”, lembra a mãe. “Hoje, aos 8, ele é
muito ligado aos ‘gostos de menino’, mas ainda tem uma ternura natural
e continua contra essa ideia de ‘coisa de menino ou coisa de menina’”,
diz.
 
Arquivo pessoal
Teo e Denize: naturalidade na aplicação da criação igualitária
 
Na prática
 
Se a ideia é criar uma criança que não defina mulheres e homens em
rígidos estereótipos, a criação de gênero neutro pode também ser usada
em níveis mais moderados, como no caso de Denize. Pais que participam
de fóruns sobre o assunto na internet recomendam medidas práticas
simples, como vestir a criança com roupas intermediárias (nem tão
cheias de babados para meninas, nem de estampas violentas para
meninos) e decorar o quarto de modo neutro (com referências à
natureza, por exemplo).
 
Muitos pais dizem combinar entre si um revezamento não só ao volante,
para abandonar o mito de que os homens são os líderes, mas também na
troca de fraldas, na hora do banho, na preparação do jantar. Na TV, há
casais que contam revezar até os canais na hora das transmissões de
esportes, prestigiando jogos de basquete ou futebol feminino na mesma
proporção que o masculino. Frases como “isso é só para meninos” ou
“isso não é jeito de uma menina se comportar” são obviamente vetadas.
 
Se a ideia da igualdade for acordada entre os pais, os mesmos valores
e atitudes passarão naturalmente para as crianças. Afinal, o que
haveria de estranho em um menino brincar com os colares e anéis da mãe
e uma garota querer usar chuteiras? “Deixar as crianças se expressarem
é positivo, mas para isso não é necessário ignorar a existência de uma
polaridade de gêneros”, conclui o psiquiatra Alexandre Saadeh.
Você concorda com a criação de gênero neutro?
Em termos. É radical demais esconder o sexo da criança, mas não vejo
problema em usar roupas e brinquedos do sexo opostoNão. É um absurdo
deixar um menino usar fantasias e brinquedos femininosSim. Os pais
devem fazer tudo para que os filhos cresçam em um ambiente de
igualdade

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