Nota
do Movimento de Luta em Defesa da Moradia (MLDM) sobre as alterações no projeto
do VLT Parangaba-Mucuripe
No último dia 12 de março, o Metrofor divulgou em
sua página mudanças no projeto do VLT Parangaba-Mucuripe. A mudança mais
significativa refere-se à nova localização da estação no Bairro de Fátima, que
inicialmente seria implantada ao lado da Rodoviária Engenheiro João Tomé, em
cima da comunidade Aldaci Barbosa, provocando a remoção de cerca de 250
famílias (segundo o Metrofor).
Com
a alteração do projeto, a estação será construída numa área em frente à antiga
localização, entre a Av. Borges de Melo e a Rua Francisco Lorda, reduzindo o
número de imóveis atingidos nesta localidade, pela estação, para aproximadamente 20.
Ainda de acordo com o Metrofor, devido a outras alterações
no projeto, estaria prevista uma redução no número total de famílias atingidas
pelo VLT de aproximadamente 2.500 para 1.700.
Cid Gomes expulso da
Aldaci Barbosa[1]
A comunidade
Aldaci Barbosa foi uma das primeiras a resistir contra as remoções do VLT e até
hoje tem se negado a colaborar com o governo. Por conta disso, no dia 02 de
agosto de 2011, o governador Cid Gomes fez uma “visita” a noite e sem aviso
prévio à comunidade, com o intuito de pressionar os moradores a aceitarem a
remoção. Acompanhado de secretários, assessores e um batalhão de seguranças
(até o comandante-geral do Polícia Militar estava lá!), Cid tentou percorrer
casa por casa, conversando com moradores a portas fechadas. Mas a tentativa de
intimidação pegando a comunidade desprevenida virou um verdadeiro vexame! Não
demorou muito e moradores de outras comunidades ameaçadas pelo VLT, militantes
de organizações políticas e de movimentos sociais se uniram aos moradores da
Aldaci. Diversos meios de comunicação cobriram Cid Gomes sendo expulso da
comunidade de forma humilhante, sob uma chuva de vaias e aos gritos de
“terrorista” e “ditador, respeite o morador!”
A resistência das
comunidades foi o determinante!
As alterações no projeto do VLT não podem ser entendidas como um ato de
benevolência do governo de Cid Gomes. Pelo contrário, a resistência das
comunidades foi o determinante!
Desde que souberam da ameaça de
remoção, no início de 2010, teve início um processo de organização e
articulação de moradores das comunidades do entorno do ramal
Parangaba-Mucuripe. Em alguns trechos, conseguiram impedir a ação das
terceirizadas, não permitindo o cadastramento das famílias nem a marcação e
avaliação dos imóveis (situação que persiste até hoje). Inúmeras assembleias, reuniões,
protestos, debates e outras atividades dentro e fora das comunidades foram
realizadas. A articulação de moradores e apoiadores resultou na formação do Movimento de Luta em Defesa da Moradia
(MLDM), que tem assumido a dianteira na luta contra as remoções.
Toda essa movimentação foi decisiva para tornar pública a situação, com
a mídia local e até nacional veiculando constantemente matérias sobre a
problemática das remoções.
Mudanças emergenciais:
a corrida contra o tempo e a Copa de 2014
Outro
recurso utilizado pelo MLDM tem sido buscar o apoio do Ministério Público
Federal e das Defensorias Púbicas, o que resultou em recomendações e ações
judiciais. Em decorrência disso, durante meses o governo foi impedido de
realizar qualquer ato desapropriatório referente à implantação do VLT. O resultado
de uma das ultimas ações foi o impedimento do inicio das obras em áreas onde
estejam previstas remoções antes que seja dada uma solução definitiva para a
questão habitacional para a população desses locais.
Diante
desse impedimento, a solução buscada pelo governo para acelerar a implantação
do VLT foi, por um lado, substituir um local de remoção por outro onde
supostamente estas não serão necessárias (caso da Aldaci Barbosa). Por outro
lado, foi necessário diminuir o tamanho de algumas estações e alterar pontos do
trajeto para diminuir a quantidade de reassentamentos (de 2.500 para 1.700,
segundo o Metrofor). Como o projeto inicial previa remoções em quase 70% do
percurso, isso emperraria a obra em sua maior parte, com o ritmo subordinado ao
da “resolução da questão habitacional”. Diminuindo o número de removidos é
possível acelerar o tempo necessário para os reassentamentos e adiantar o
andamento das obras.
A resistência das comunidades tem sido
decisiva para o enorme atraso na implantação do VLT. O prazo inicial previsto
na Matriz de Responsabilidades[2] era de
30 meses (de janeiro de 2011 a junho de 2013). Depois disso foram anunciados
pelo menos 5 datas diferentes. Já o edital de Licitação do VLT define um prazo
de 18 meses[3]
para que o consórcio vencedor finalize a implantação do empreendimento. A
contar de abril de 2012, quando tiveram inicio as primeiras intervenções, o
atraso já inviabiliza que o trensinho fique pronto para a Copa das
Confederações, em junho de 2013. Para tentar evitar o risco de não tê-lo para
2014, o governo do Ceará foi obrigado a alterar o projeto.
A luta não vai parar
aqui!
Não
resta dúvidas que a diminuição dos impactos sobre a população residente no
entorno do trilho deve ser considerada uma conquista
(e não uma dádiva!) para as comunidades e o Movimento. No entanto, a luta
ainda está longe de terminar, visto que:
1. O número de remoções permanece
absurdamente alto (1.700 segundo o Metrofor) e consideramos de fundamental
importância que sejam exploradas outras
alterações no projeto, sobretudo referentes ao traçado, que podem reduzir
drasticamente o número de remoções;
2.
Consideramos
o plano de reassentamento do governo completamente inadequado, visto que desconsidera
a existência de terrenos no entorno das comunidades, pretendendo realocar as
famílias em conjuntos habitacionais nos limites de Fortaleza (no José Walter e
na Paupina), sem garantias de equipamentos e serviços sociais suficientes
(escolas, creches, hospitais, postos de saúde, igrejas, etc.), provocando danos
socioeconômicos de grande proporção para famílias de baixa renda, como a
impossibilidade de trabalho e renda, já que no caso das famílias do VLT, isso
depende diretamente do local de moradia (muitos são pescadores, trabalham nos
prédios ao lado como diaristas, babás e outros serviços, nas lojas do entorno,
como ambulantes na praia, nos restaurantes, etc.). Por tanto, depois de exploradas
novas alterações no traçado, persistindo os casos de reassentamentos, devem ser
consideradas todas as possibilidades de realizá-los no entorno das comunidades,
em condições adequadas de moradia e com direito de participação e decisão
efetivos da população atingida na elaboração do plano habitacional;
3.
Persiste
a insegurança das famílias em relação ao valor extremamente baixo das
indenizações. O aluguel social (R$ 200), que além de completamente insuficiente
para custear condições adequadas de moradia, revela-se na prática um recurso
perverso, pois costuma postergar-se por tempo excessivo, gerando uma situação
extrema de vulnerabilidade para as famílias. Com a necessidade de acelerar a
implantação do VLT, tememos que o governo do Estado faça uso excessivo do
aluguel social, por meio do rebaixamento forçado das indenizações (imóveis
avaliados em até R$ 16.000 dão “direito” ao aluguel social), o que lhe
permitiria postergar os reassentamentos, estendendo por tempo indefinido o
martírio dos removidos.
Por fim, nós
sempre insistimos na necessidade e
na possibilidade de serem feitas
alterações no projeto do VLT que eliminassem ou reduzissem drasticamente os
impactos sobre a população residente no entorno do trilho. O governo do Estado
do Ceará, por sua vez, quando não se fazia de mouco, lançava alegações
supostamente técnicas que impossibilitavam ditas alterações (e só as fez quando
esteve diante de alguma ameaça!). Hoje, tendo que cumprir os prazos para a Copa
do Mundo, demonstra-se mais uma vez que as impossibilidades foram sempre de
outra ordem, pois consistem em conciliar um projeto de mobilidade urbana à
política de higienização social em uma área de farto interesse econômico
(comercial, imobiliário e turístico) em Fortaleza.
QUANDO OS DE BAIXO SE
MEXEM, OS DE CIMA BALANÇAM!!
Fortaleza, 15 de abril de 2012.
Movimento
de Luta de Defesa da Moradia (MLDM)
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