sábado, 25 de setembro de 2010

MOVIMENTO ESTUDANTIL E TRABALHO DE BASE

Por Vinícius Oliveira- “Doug”
MOVIMENTO ESTUDANTIL E TRABALHO DE BASE: ABRINDO CAMINHOS DE LUTA.

“A questão de atribuir um pensamento humano, uma verdade objetiva não é uma questão teórica, mas sim uma questão prática. É na práxis que o homem precisa provar a verdade”
Karl Marx
“É muito mais difícil e muito mais precioso mostrar-se revolucionário quando a situação não permite ainda a luta direta, declarada, verdadeiramente macia, verdadeiramente revolucionária, saber defender os interesses da revolução (pela propaganda, pela agitação, pela organização) em instituições não revolucionárias, ou mesmo claramente reacionárias, num ambiente não revolucionário, entre massas incapazes de compreender de imediato a necessidade de um método de ação revolucionária...”
Lênin
1- Introdução.
Todo movimento social necessita criar suas barricadas fortes para que possa resistir e agir . E o primeiro passo na construção dessa barricada é definir um objetivo, concepção e organização.
O movimento estudantil “Barricadas abrem caminhos” tem um objetivo fundamental que é a revolução socialista. Mas dentro desse objetivo o movimento localiza-se dentro do movimento de educação (particularmente universitário) mas não para limitar-se à ele, mas para a partir dele conseguir pintar de povo a universidade, a educação, o Brasil e o mundo.
Nesse contexto compreendemos a concepção do movimento estudantil classista como movimento social, que alia-se à classe trabalhadora e suas organizações, mas respeita a autonomia de si e de outras organizações. Para que o ME não vire correia de transmissão de pautas que não possam ter consonância.
Todo movimento só tem razão social de ser quando consegue entender as contradições sociais com que trabalha e qual a base social que o sustenta.
Por isso a discussão de trabalho de base é importantíssima no movimento estudantil, mas não basta apenas repetir as cartilhas do MST (sem dúvida o movimento social mais importante da América latina) ou de outras organizações, temos que formular a discussão de trabalho de base aproveitando as diversas experiências, mas com um olhar firme para nossos objetivos e nossa concepção
Encarando de tal forma, o debate sobre o projeto de educação do nosso país, da nossa universidade, polarizado hoje dentro da reforma universitária é vital para amadurecer qualquer espécie de discussão e atuação do movimento estudantil, se defende uma educação voltada para as elites ou voltada para o povo e a posição da reforma reflete isso.
Assim, pretende-se formular CONTRIBUIÇÕES, no sentido dialético, para a discussão do trabalho de base no movimento estudantil para potencializar nossas barricadas contra o capital e abrir caminhos de Luta.
2- O que seria trabalho de base?
Trabalho de base consiste em diferentes métodos de trabalhar uma causa dentro de uma coletividade específica (no caso estudantes), casado com uma leitura da realidade material e subjetiva, para formular sujeitos ativos da transformação social.
3- A importância do trabalho de base?
Marx já dizia que não são as idéias que moldam o mundo, mas o mundo na relação dialética com as idéias que determinam a realidade social. Então não basta que apresentemos o programa mais revolucionário ou mais à esquerda. O programa tem que apresentar consonância material e subjetiva com a atuação práxys do movimento.
Nesse sentido a leitura da realidade (ou conjuntura) mais acertada localmente, nacionalmente e internacionalmente reflete na construção do movimento, casado com sua concepção e organização que interfere no seu modo de ser e trabalho de base.
Na história da luta de classes a história não se move em forma linear, nem de forma evolutiva. A dialética da realidade não é estática, é movimento. Não podemos acreditar que porque a organização vai bem, ela sempre irá bem, está “evoluindo”. Nos momentos de Ascenso e descenso da organização a avaliação deve permanecer.
Prestemos atenção em 2 aspectos:
Fatores externos: que influi a conjuntura sua de outras organizações, inimigos de classe, descenso das lutas sociais.
Fatores internos: como pode haver um quadro grande de renovação de militância, erro no ritmo da luta, ou até mesmo o “tarefismo”,a falta de formação política e disciplina consciente.
4- Quem faz o trabalho de base?
Quem deve executar o trabalho de base é a ORGANIZAÇÃO. Por mais que algumas vezes a organização apresente-se com um ou poucos indivíduos, é para o chamado à coletividade que devemos apresentar nossa pauta.
A falta da organicidade à luta podem levar a erros históricos como a luta individual ou ao ativismo. E muitas vezes leva a atuação a um ciclo vicioso da eterna partida do ponto 0. Porque as pessoas não conseguem visualizar que cada luta é tocada pela organização. E que além da disputa pelo ganho material da pauta é a organização dos mesmos que garante qualquer conquista.
As formas de organização mais abertas, democráticas e formuladoras que estimulam o protagonismo social, a discussão dos pontos do problema ligados a questão mais ampla e entendem a importância do companheirismo, respeito ,solidariedade, alegria e ousadia na luta cotidiana ecoam mais enfaticamente nas escolhas.
5- A ideologia e os perfis dos estudantes

Uma discussão vital no campo da esquerda é a discussão da ideologia e do processo de consciência. A classe trabalhadora e os estudantes são doutrinados pela ideologia a seguir a vida material, os anseios e os sonhos burgueses. A família, o trabalho, a religião, a educação formal, a mídia e o Estado tentam garantir a sobrevivência da ordem burguesa e também a sua legitimação, tanto no campo material quanto na subjetividade.

De tal forma, que não podemos compreender o movimento estudantil apenas analisando-o por dentro, tanto seus acertos quanto os seus erros, mas analisar a atuação do mesmo dentro da conjuntura social. Vivemos uma conjuntura no Brasil de descenso das lutas sociais, cooptação das maiores organizações da classe trabalhadora (PT, UNE e CUT), sectarismo dentro da própria esquerda e um consenso conservador e individualista que nada se transforma pela coletividade. Vivemos em uma conjuntura de resistência e reorganização.

Então resta-nos entender o nosso campo de ação, ou seja nossa base social: os estudantes. Sabemos que os estudantes são policlassistas o que dificulta nossa intervenção de classe. Mas mesmo assim é dever nosso cumprir o nosso papel.
Dessa forma existem diversos interesses IMEDIATOS da estudantada na sua relação com a universidade o que pode refletir tanto na sua relação com a mesma, quanto com o movimento estudantil. Essa relação se dá também pela condições materiais que o individuo está submetido. Os interesses IMEDIATOS podem ser:
Acadêmicos - em uma formação acadêmica, formar-se intelectual (podendo cair na falsa separação trabalho braçal x intelectual)
Interesses puramente festivos- curtir a universidade, aproveitar os momentos lúdicos, conhecer novas pessoas e visões.
Carreiristas- por questão de emprego e sobrevivência. Estar na universidade para crescer no trabalho ou fazer concurso. Ou para garantir a famosa independência financeira.
Poder -assumir status na sociedade burguesa, afirmação pessoal ou familiar.
Transformação- pode ser individual,familiar, coorporativa e até de classe. As vezes pela ótica trabalhador ético e honesto que faz o “bem” pelo seu “bom” trabalho.
Não se trata de demonizar ou vangloriar um perfil acima do outro. Nem se trata de encaixar as pessoas dentro desses perfis. Esses tipos de perfis podem tanto se adentrar nas organizações estudantis de luta, quanto nas pelegas. Podem existir diversos interesses ou perfis não mencionados.
Esse tipo de discussão nos leva a pensar em como entendendo os interesses imediatos dos estudantes possamos fazem uma disputa de consciência, e pautar nossa atuação. É mais um recurso metodológico do que uma linha política.
6- Metodologia de trabalho de base no Movimento Estudantil
Processo de “Engajamento” no ME. (ou quem sabe de consciência)
A- Contradição x Indignação.
Não é o movimento em si que desperta, mas a contradição em movimento que pode indignar os indivíduos. Precisamos entender que os estudantes muitas vezes sabem que as contradições existem, mas sempre de forma “mediada”. Trabalhar com o ver, sentir, cheirar, tatear,ouvir e para evitar o desânimo trabalhar a contradição apontando a organização.
Entender que o capital tem “contradições” em todas as suas etapas e dentro da universidade como fora dela. Existem diferenciações dentro de um curso para outro, da relação entre professor e estudante, dos apadrinhados pelos que topam enfrentamento, entre os próprios funcionários, entre a formação colocada e o emprego imposto pelo mercado, entre a propaganda falseada e a realidade.
Exemplo: Na Universidade Federal de Sergipe, à 3 anos no primeiro dia de aula levamos os estudantes calouros de comunicação a conhecer os espaços da universidade e fazemos uma breve explicação sobre cada espaço e sua importância. Mas particularmente sempre levamos os calouros a conhecer a ante-sala do gabinete do reitor (sem aviso prévio) e pedimos que tirem uma “foto mental”(sem mediações) desse espaço para comparar com o nosso departamento. A contradição é alarmante e incontestável, porque falta estrutura para um departamento enquanto o gabinete da reitoria ostenta algo que só existe naquele espaço?
B-Indignação x participação
A partir do momento que trabalha-se a contradição e desperta a indignação,muitas perguntas surgem. É preciso que fique claro que esse processo não acontece com todos os indivíduos e também não ao mesmo tempo.
A indignação não é um passo completo na consciência, ela também pode se perder, por ser um sentimento ela passa. O indignado ainda pode-se mover pelos interesses individuais e achar que a resolução dos seus problemas por meios que apenas o favoreçam. Então dizer que o mundo vai mal, a universidade tá ruim pode trazer a linha de raciocínio:“ Então vou fazer o meu e foda-se o resto”. Ou seja também, pode cair na indignação INDIVIDUALISTA.
Devemos enfrentar a ideologia, que trata-se do falseamento da realidade e a universalização das idéias da classe dominante. Na hora da indignação devemos trabalhar a FORMAÇÃO. Através de debates que partam da realidade IMEDIATA. E combater os “mitos” ou as “verdades” que são minimamente perigosas para o avanço do trabalho de base no movimento estudantil.
Combater qualquer saída individualista, mostrando a importância da coletividade e da organização até mesmo para a conquista das pautas minimas. E que nós devemos ser os construtores da nossa própria história. Jogando qual o compromisso que nós devemos ter com a sociedade.
Exemplo: 1-Na mesma calourada (ou semana do calouro) no segundo dia realizamos um espaço sobre “Universidade e Formação”, convidando um estudante e um professor(ou convidado), para quebrar a idéia do professor como latifundiário do conhecimento e juntos teorizarmos sobre o que vemos e vivenciamos. Mostrar que conhecimento e educação no sentido epistemológico paulo freiriano são as idéias da classe dominante e que eles não vão sair da universidades “formados”, mas que estão passando por um processo de formação, e que o tempo todo vão ter que escolher se produzem conhecimento para os dominantes ou para povo.
Exemplo 2- Na mobilização por qualidade, realizar uma assembléia, discutir a pauta e propor comissões abertas além da organização, para que outras pessoas se inseriam na pauta e a partir dela na organização. Mostrando que temos que propor e agir.
C-Participação x ORGANICIDADE
Acreditar na coletividade é um passo. Exercitar a coletividade é um desafio!
Não somos formados para viver a coletividade. É difícil pensarmos enquanto organização e nos sentirmos parte dela. Adentramos em uma organização e sempre a testamos para saber se ela serve ou não, se aquele era discurso tem consonância prática.
Mostrar abertamente a organização como algo aberto e móvel . Que ela é instrumento da luta.
Exemplo: As pessoas quando entram nas organizações e pegam as tarefas que mais se identificam, não se desafiam em expandir seus horizontes. Não se desafia a pensar a organização.
Organicidade no planejamento e divisão equitativa das tarefas.
A organicidade real do movimento é sentida quando existe uma formação coletiva e quando as tarefas também são encaradas dessa forma. Organizações que legitimam a concentração de tarefas e o personalismo não tendem a durar muito. Isso não desqualifica a formação de referências.
É preciso sensibilidade no cotidiano da organização. Prestar atenção na companheirada mais nova, envolver nas discussões, leituras e tarefas. Cobrar das pessoas mais experientes atenção, cuidado e compromisso. Trazer pautas para organização que contemplem os diferentes perfis de militantes, trabalhando discussões acadêmicas,culturais, mobilizadoras.
Importante também nesse aspecto sair um pouco da universidade. Mostrar que existem outras organizações, movimentos sociais e que nossa tarefa é estar aliada a esse setores.
D- POSICIONAMENTO DE CLASSE
A partir do estudante vivendo a contradição, organizando-se e colocando-se em movimento. Os caminhos para a construção e posicionamento de classe entrelaçam dialeticamente com a nossa forma de fazer movimento. Nossas referências de movimentação, leituras, até uso de roupas abrem a mente da galera para que possamos dialogar sobre qual a grande questão da classe trabalhadora: a Luta de classes.
Nesse momento é adequado unirmos as pautas estudantis as pautas da classe trabalhadora, sem menosprezar a luta estudantil. A importância de estarmos juntos aos movimentos sociais de maneira critica (para também não virarmos correia de transmissão!). Enfim, de fazermos luta para quebrar os muros da universidade.
Não trata-se de dissociar a luta de classes da luta do movimento estudantil. Mas sim de saber como vamos relacionar a luta do movimento estudantil com a luta da classe trabalhadora.
* Formação Política
Sempre que entramos no movimento estudantil, temos a impressão que a luta começa quando entramos. A formação política é fator fundamental no trabalho de base. Compreender o que fazemos, porque fazemos e que a nossa luta é muito anterior a nossa existência e que continuará além dela.
É fundamental termos um referencial teórico nos nossos cursos dentro do marxismo. E compreender a luta de classes e sua história de lutas no Brasil e no mundo. Entender o capitalismo e suas bases econômicas-políticas. Compreender qual o projeto de educação defendido pelo capital na atual conjuntura e dentro de todo o contexto qual o papel do movimento estudantil.
*Quantitativo x Qualitativo.
Um dos erros que os diferentes movimentos fazem é avaliar o trabalho de base pelo critério apenas quantitativo. E também não podemos avaliar pelo critério apenas qualitativo (companheirada bem politizada!).
O sentido do trabalho de base é seguir a dialética de quantitativo e qualitativo. Não adianta formar um grupo qualificado que não consegue organizar a estudantada para mobilizações, e não adianta um grupo massivo que não tem o debate tático e estratégico claro.
7- PARA OS QUE VIRÃO
Quem trata de fragmentar o ser é o capital. Não podemos cair na dicotomia entre sentir e pensar. A sensibilidade militante deve nortear nossa luta cotidiana colado com o nosso sonho da revolução socialista.
A criatividade e a ousadia devem também fazer parte da nossa atuação. É na ousadia, no fazer diferente que as pessoas sentem o tesão pela luta e pela organização, devemos ser o estimulante dos militantes criativos e ousados.
Sempre ouvimos que o Movimento estudantil é passageiro, mas o movimento deve ser permanente quem é passageiro é o militante.
É papel da organização e dos militantes INSPIRAR. Trazer a cabeça e o coração para pensar a luta. Estimular valores de lutadores que sabem que não carregam as verdades do mundo, mas que sabem e sentem o compromisso que nossa história não nos deixa esquecer.
Então o nosso trabalho de base deve ser voltado para os que virão. Para os novos. Para o despertar de novos lutadores e lutadoras. Para que em meio a essa sociedade que queima de ódio, egoísmo e desigualdades façamos chuvas de contestação.

Chuvas de Contestação
por Vinícius Oliveira

A seca de esperanças
faz com que criemos chuvas de contestação
Correr atrás do objetivo da transformação
cair na realidade e dar de cara no chão
morrer enquanto individuo e renascer
enquanto organização
organizar nossa teoria
organizar nossa ação
sensibilizar os indivíduos para a transformação
formar a militância com a cabeça e o coração
lutar, mesmo de mãos atadas,
pois, o compromisso é com a nossa classe
criatividade e ousadia
devem ser a nossa agitação
inspirar a nossa juventude
inspirar o sujeito na atuação
criando barricadas de idéias
abrindo caminhos para a revolução

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